1. Introdução
A legislação tributária do Estado de Goiás permite que o contribuinte que detiver saldo credor de ICMS acumulado, possa transferi-lo a terceiros que com ele mantenha relação comercial, desde que previamente autorizado pela Secretaria de Fazenda (artigo 8º, parágrafo único da IN GSF nº 715/2005).
Para que o contribuinte possa acumular saldo credor de ICMS em sua escrituração fiscal, é necessário preencher diversos critérios, dentre os quais: (a) ser contribuinte do ICMS; (b) realizar a escrituração dos livros fiscais e da EFD; (c) realizar operações isentas ou não tributadas, precedidas de operações tributadas, desde que as primeiras estejam condicionadas à manutenção dos créditos, ou estarem abrigadas pela imunidade tributária incidente sobre as exportações; (d) realizar operações sujeitas ao regime da substituição tributária, incorrendo nas hipótese de ressarcimento de créditos previstas nos artigos 45 e 46 do Anexo VIII do RCTE.
2. Cumprimento de obrigações acessórias
2.1. Emissão de nota fiscal eletrônica e Escrituração Fiscal Digital – EFD
Via de regra, os produtores rurais estão dispensados de emitir sua própria nota fiscal, e, por consequência, também ficam dispensados de escriturarem seus livros fiscais.
No entanto, podem ser autorizados a emitir sua própria nota fiscal, desde que, no exercício imediatamente anterior, tenham auferido receita bruta anual, inferior ou igual à R$ 3.500.000,00, do conjunto de seus estabelecimentos, e, desde que, cumulativamente: (a) adote o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS com escrituração dos livros fiscais; b) faça escrituração contábil; c) apure o Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza – IR – pelo lucro real. (artigo 2º, incisos I e II da IN GSF 673/2004).
Curiosamente, para quem fatura acima deste valor, a IN GSF 673/2004 exige que o contribuinte adote apenas o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS com escrituração dos livros fiscais, sem necessidade de apurar o IR pelo Lucro Real.
2.1.1. Nota fiscal modelo 1 ou 1-A ou Nota Fiscal Eletrônica Modelo 55
O produtor agropecuário, pessoa jurídica ou física, inscrito no CCE, independentemente de preencher qualquer uma das opções anteriores, pode, também, por meio de credenciamento, ser autorizado a emitir a sua própria Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, desde que adote o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS, com escrituração dos livros fiscais, utilizando-se do crédito presumido previsto no art. 14 em substituição à apropriação de qualquer outro crédito de ICMS (artigo 3º da IN GSF 673/2004).
O texto faz referência à nota fiscal modelo 1 ou 1-A, documento ainda possível de ser emitido pelo produtor rural, contudo, com advento da IN GSF nº 1.582/2024, acrescentou-se o parágrafo único ao artigo 3º da IN GSF 673/2004, para autorizar o produtor a se credenciar para emissão da nota fiscal eletrônica, modelo 55 (artigo 114, incisos XXIV e XXV, c/ art. 167-B, todos do RCTE).
E, na hipótese de o produtor rural adotar o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS, com escrituração fiscal do ICMS, passa a ser obrigado a se sujeitar à escrituração da EFD (artigo 1º, § 1º da IN GSF 1.020/2010).
Saliente-se que, pela IN GSF 1.020/2010, o produtor rural estaria obrigado a escrituração digital, se seu CNPJ base estiver relacionado no site da SEFAZ (artigo 1º, “caput”, c/c § 3º, todos da IN GSF 1.020/2010). E, mesmo não estando relacionado, poderá fazer sua opção (artigo 1º, “caput”, c/c § 4º, todos da IN GSF 1.020/2010).
Sendo contribuinte do ICMS, e possuindo a escrituração fiscal, bem como o preenchimento da Escrituração Fiscal Digital, o produtor rural cumpre as duas primeiras condições exigidas pela legislação goiana.
3. Benefícios fiscais com produtos agrícolas
A terceira condição é realizar saídas tributadas com o ICMS. Ocorre que a legislação tributária do Estado de Goiás, não muito diferente das legislações de outros Estados, impõe benefícios fiscais sobre as operações com produtos agropecuários (arroz, aveia, cacau, café em coco e em grão, cana-de-açúcar, canola, cogumelo comestível, cominho, gergelim, girassol, leite em estado natural, mamona, milho, sisal, soja e trigo), hortifrutigranjeiros (frutas, verduras, legumes, ovos e outros) (artigo 6º, incisos LXXVIII[1], XI[2] e XLIX[3], do Anexo IX do RCTE).
Todas estas operações não possuem o direito à manutenção dos créditos de ICMS cobrado sobre as mercadorias adquiridas, via de regra, de modo que, mesmo possuindo escrituração fiscal regular, os créditos sobre estes insumos, deveriam ser estornados ou não apropriados (artigo 58 inciso I do RCTE), razão pela qual não há que se falar em hipótese acumuladora de créditos.
Nas saídas para comercialização, notadamente sobre os produtos relacionados no artigo 6º, inciso LXXVIII do Anexo IX do RCTE (citando como exemplo), o produtor rural, ou vende seu produto com fim específico de exportação ou vende para um comerciante, normalmente detentor de um termo de credenciamento impondo-lhe a obrigação de recolher o ICMS do produtor, de forma diferida.
4. Regras exigidas para que o contribuinte possa transferir seu saldo credor de ICMS
Nestas hipóteses, o produtor poderá tomar os créditos relacionados aos insumos de suas entradas. Sendo constante estas operações, o produtor rural ao acumular crédito de ICMS em sua escrita fiscal poderá transferir seu saldo credor, de acordo com o que dispõe a IN GSF 715/2005.
A IN GSF 715/2005 prevê as hipóteses de acúmulo de crédito decorrente de exportação (artigos 2º, 3º, inciso I), de substituição tributária pelas operações posteriores (artigo 3º, inciso I-A, I-B, II, III) e de benefícios fiscais (artigo 3º, inciso VI e XIV).
Na hipótese do acúmulo de crédito previsto no item 2 da alínea “b” do inciso VI do artigo 3º e no inciso XIV, da IN GSF 715/2005, a transferência de crédito somente se aplica às máquinas, aos equipamentos, aos veículos ou aos materiais de construção adquiridos após o período de 12 meses consecutivos de acúmulo de crédito, e somente a partir de 1º de julho de 2022, em se tratando do inciso XIV do artigo 3º.
4.1. Hipótese excepcional de transferência de saldo credor acumulado
Esta hipótese é a mais curiosa, porque ela exige que o destinatário do crédito objeto da transferência se destine a outro contribuinte estabelecido no Estado de Goiás do qual tenha adquirido máquinas, equipamentos, veículos ou materiais de construção, e que os bens adquiridos sejam destinados à integração ao ativo imobilizado e a obras civis de estabelecimento localizado em Goiás e pertencente à empresa remetente do crédito.
Observe que a hipótese trata de crédito relacionado com operação ou prestação abrigada por benefício fiscal ou por tratamento tributário diferenciado previsto em lei específica, associados com o de manutenção de crédito pela entrada (Decreto nº 10.089/2022).
Ressaltado a condição de manutenção do crédito na escrita fiscal a que se refere o item 2 da alínea “b” do inciso VI do artigo 3º e no inciso XIV, da IN GSF 715/2005, para que os demais créditos sejam transferidos é exigido pela legislação que o contribuinte tenha um saldo credor acumulado mínimo de 3 meses consecutivos. Além disso, há um percentual de crédito a ser transferido, que não pode ultrapassar a média aritmética entre os saldos credores apurados nos últimos 3 meses imediatamente anteriores ao de referência e o saldo credor verificado no mês imediatamente anterior ao de referência.
Por fim, a transferência de crédito a outro contribuinte ainda fica limitada à 30% do valor da aquisição da mercadoria, bem ou serviços nas situações previstas no artigo 3º, inciso I e VI, quando o destinatário do crédito for o substituto tributário.
No que pertine à situação acumuladora de crédito pelo produtor rural, considerando as dificuldades deste cenário acontecer, seus créditos só poderiam ser transferidos observando uma limitação muito rígida, não podendo ser superior à 30% do saldo credor correspondente à média aritmética dos últimos 3 meses.
O percentual de 70% (artigo 5º, inciso IV, alíneas “b” da IN GSF 715/2005) de transferência de saldo credor para aquisição de máquinas, equipamentos, veículos ou materiais de construção, vaticinado por profissionais do seguimento tributário, não se aplicam aos produtores rurais, pois a norma em questão (inciso XIV do artigo 3º da IN GSF 715/2005), trata de crédito acumulado em razão de benefício fiscal ou por tratamento tributário diferenciado previsto em lei específica (vide artigo 2º do Decreto 10.089/2022), não aplicável ao produtor rural.
5. Conclusão
A legislação tributária, especialmente sobre os incentivos fiscais, possui inúmeras particularidades, requerendo do contribuinte muita cautela. A legislação exige dos produtores vários termos de credenciamento para se adequarem aos demais contribuintes inscritos como pessoas jurídicas. A grande maioria dos produtores são cadastrados na pessoa física, atuando de modo muito informal.
Com a instituição da CBS, a produzir efeitos, efetivamente, a partir de 2027, e do IBS, a partir de 2029, será necessário que este seguimento empresarial, busque se adaptar às novas alterações de comportamento, inclusive quanto ao ICMS, uma vez que este tributo será extinto somente em 2033.
[1] Isenção condicionadas à saída para industrialização, bem como que o destinatário recolha o FUNDEINFRA.
[2] Quando não destinados à industrialização.
[3] Hostifrutícolas, quando destinados à industrialização.