19 de agosto de 2025

Transferência de crédito de ICMS acumulado – Parte 2

Introdução. Cumprimento de obrigações acessórias. Emissão de nota fiscal eletrônica e Escrituração Fiscal Digital – EFD; 2.1.1. Condições exigíveis para que os detentores de saldos credores envolvam produtores rurais. 2.1.1.1. Emitir Nota fiscal modelo 1 ou 1-A ou Nota Fiscal Eletrônica Modelo 55 e adote regime periódico de apuração mediante a escrituração fiscal. 3. Potencialidade de acúmulo de crédito de ICMS. 3.1. Diferimento. 3.2. Exportação. 3.3. Benefícios fiscais com produtos agrícolas – Isenções ou Reduções de base de cálculo. 4. Regras exigidas para que o contribuinte possa transferir seu saldo credor de ICMS. 4.1. Hipótese excepcional de transferência de saldo credor acumulado. 4.1.1. Transferência de saldo credor de ICMS acumulado em razão de exportações. 5. Conclusão.

 

1. Introdução

 

A legislação tributária do Estado de Goiás permite ao contribuinte que detiver saldo credor de ICMS acumulado em sua escrita fiscal, possa transferi-lo a terceiros que com ele mantenha relação comercial, desde que previamente autorizado pela Secretaria de Fazenda (artigo 8º, parágrafo único da IN GSF nº 715/2005).

 

Para que o contribuinte possa acumular saldo credor de ICMS em sua escrituração fiscal, é necessário preencher diversos requisitos formais e materiais, dentre eles:

 

(a) ser contribuinte do ICMS;
(b) realizar a escrituração dos livros fiscais na EFD;
(c) realizar operações isentas ou não tributadas, precedidas de operações tributadas, desde que as primeiras estejam condicionadas à manutenção dos créditos, inclusive naquelas decorrentes de operações abrigadas pela imunidade tributária incidente sobre as exportações;
(d) realizar operações sujeitas ao regime da substituição tributária, incorrendo nas hipótese de ressarcimento de créditos previstas nos artigos 45 e 46 do Anexo VIII do RCTE.

 

2. Cumprimento de obrigações acessórias

 

2.1. Emissão de nota fiscal eletrônica e Escrituração Fiscal Digital – EFD

 

2.1.1. Condições exigíveis para que os detentores de saldos credores envolvam produtores rurais

 

 

Via de regra, os produtores rurais estão dispensados de emitir sua própria nota fiscal, e, por consequência, também ficam dispensados de escriturarem seus livros fiscais.

 

No entanto, podem ser autorizados a emitir sua própria nota fiscal, desde que, no exercício imediatamente anterior, tenham auferido receita bruta anual, inferior ou igual à R$ 3.500.000,00, do conjunto de seus estabelecimentos, e, desde que, cumulativamente:


(a)
adote o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS com escrituração dos livros fiscais;

(b) faça escrituração contábil;

(c) apure o Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza – IR – pelo lucro real. (artigo 2º, incisos I e II da IN GSF 673/2004).

 

Curiosamente, para quem fatura acima deste valor, a IN GSF 673/2004 exige que o contribuinte adote o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS com escrituração dos livros fiscais, nem a necessidade de opção por qualquer regime de tributação atinente a apuração do IR.

 

2.1.1.1. Emitir Nota fiscal modelo 1 ou 1-A ou Nota Fiscal Eletrônica Modelo 55 e adote regime periódico de apuração mediante a escrituração fiscal

 

O produtor agropecuário, pessoa jurídica ou física, inscrito no CCE, independentemente de preencher qualquer uma das opções anteriores, pode, também, por meio de credenciamento, ser autorizado a emitir a sua própria Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, desde que adote o regime periódico de apuração e pagamento do ICMS, com escrituração dos livros fiscais, utilizando-se do crédito presumido previsto no art. 14 em substituição à apropriação de qualquer outro crédito de ICMS (artigo 3º da IN GSF 673/2004).

 

O texto faz referência à nota fiscal modelo 1 ou 1-A, como documento ainda possível de ser emitido pelo produtor rural, contudo, com advento da IN GSF nº 1.582/2024, acrescentou-se o parágrafo único ao artigo 3º da IN GSF 673/2004, para autorizar o produtor rural a se credenciar para emissão de sua nota fiscal eletrônica, modelo 55 (artigo 114, incisos XXIV e XXV, c/ art. 167-B, todos do RCTE).

 

E, na hipótese de o produtor rural adotar regime periódico de apuração e pagamento do ICMS, com escrituração fiscal do ICMS, passa a ser obrigado a se sujeitar à escrituração da EFD (artigo 1º, § 1º da IN GSF 1.020/2010). Neste caso, potencialmente, o produtor não poderá optar pelo regime do crédito presumido (artigo 3º da IN GSF 673/2004), caso a peculiaridade de suas operações permita antever possível situação geradora de créditos de ICMS.

 

Saliente-se que, pela IN GSF 1.020/2010, o produtor rural estaria obrigado a escrituração digital, se seu CNPJ base estiver relacionado no site da SEFAZ (artigo 1º, “caput”, c/c § 3º, todos da IN GSF 1.020/2010). E, mesmo não estando relacionado, poderá fazer sua opção (artigo 1º, “caput”, c/c § 4º, todos da IN GSF 1.020/2010).

 

Sendo contribuinte do ICMS, e possuindo a escrituração fiscal – EDF, o produtor rural cumpre as duas primeiras condições exigidas pela legislação goiana.

 

3. Potencialidade de acúmulo de crédito de ICMS

 

3.1. Diferimento

 

Para que o produtor rural possa então, acumular crédito de ICMS em sua escrituração fiscal, será necessário que suas operações posteriores sejam abrigadas por diferimento (situação em que o adquirente seja um detentor de termo de credenciamento que lhe permita recolher o ICMS das operações posteriores conjuntamente com suas operações próprias) (artigos 2º, § 2º, § 2º-A, 3º, 5º e 6º, do Anexo VIII do RCTE).

 

3.2. Exportação

 

A outra hipótese seria no caso em que o produtor rural exporte mercadorias para o exterior, seja diretamente ou indiretamente (via trading company ou comercial exportador).

 

Nestes casos, trata-se de imunidades constitucionais, previstas, respectivamente nas seguintes legislações, constitucionais e infraconstitucionais:


(a)
artigo 155, § 2º, inciso X, “a” da CF/1988;

(b) artigo 3º, inciso II, c/c parágrafo único da LC 87/1996);

(c) artigo 33, inciso I, c/c artigos 38 e 38-A do Anexo IX do RCTE (condicionado ao pagamento do FUNDEINFRA).

 

3.3. Benefícios fiscais com produtos agrícolas – Isenções ou Reduções de base de cálculo

 

A terceira condição é realizar saídas tributadas com o ICMS. Ocorre que a legislação tributária do Estado de Goiás, não muito diferente das legislações de outros Estados, impõe benefícios fiscais sobre as operações com produtos agropecuários (arroz, aveia, cacau, café em coco e em grão, cana-de-açúcar, canola, cogumelo comestível, cominho, gergelim, girassol, leite em estado natural, mamona, milho, sisal, soja e trigo, hortifrutigranjeiros (frutas, verduras, legumes, ovos e outros) (artigo 6º, incisos XI[1], LXXVIII[2] e XLIX[3],  do Anexo IX do RCTE).

 

Todas estas operações não possuem o direito à manutenção dos créditos de ICMS cobrado sobre as mercadorias adquiridas (salvo em se tratando de saídas para comercialização interestadual), de modo que, mesmo possuindo escrituração fiscal regular, os créditos sobre estes insumos, devem ser estornados ou não apropriados (artigo 58 inciso I do RCTE), razão pela qual não há que se falar em hipótese acumuladora de créditos.

 

Nas saídas para comercialização, notadamente sobre os produtos relacionados no artigo 6º, inciso LXXVIII do Anexo IX do RCTE (citando como exemplo), o produtor rural tem três alternativas possíveis de comércio:


(a)
ou vende seu produto com fim específico de exportação;

(b) ou vende para um comerciante, normalmente detentor de um termo de credenciamento impondo-lhe a obrigação de recolher o ICMS do produtor, de forma diferida; ou,

(c) vende seu produto em operações interestaduais tributadas.

 

Neste último caso, em se tratando de produtos como: feijão, milheto, milho, soja, sorgo, couro wet-blue; couro em estado fresco, salmourado ou salgado e wet-blue; queijo e requeijão; gado bovino e bufalino; semente de capim ou café cru, em coco ou em grão, o pagamento do ICMS deve ser feito antecipadamente, salvo se possuir termo de credenciamento (artigo 1º, § 3º, inciso I da IN GSF 673/2003).

 

Considerando o cumprimento de todas as obrigações principais e acessórias, o produtor rural poderá tomar créditos de aquisições de produtos (matéria-prima) e insumos e material intermediário aplicável ao processo produtivo, energia elétrica, combustível dentre outros. Nestas situações excepcionais, pode ocasionar situação de acúmulo de crédito de ICMS.

 

Deve-se registrar que o POTENCIAL de acúmulo de crédito de ICMS é uma decorrência da estratégia operacional do produtor que deve antever, por meio de planejamento estratégico, situações que lhe confiram vantagem competitiva, e deve ser contemporâneo ao negócio. Não é possível após quase 05 (cinco) anos da realização de todas estes eventos, tentar reconstituir obrigações acessórias, termos de credenciamento, e, etc., para reaver créditos de ICMS com o objeto de comercializar seus saldos credores, que, como se observa, deverá observar as condições exigidas na IN GSF 715/2005, a seguir expostas.

 

4. Regras exigidas para que o contribuinte possa transferir seu saldo credor de ICMS

 

Nestas hipóteses, o produtor ou qualquer detentor de saldo credor de ICMS acumulado em sua escrita fiscal poderá transferi-lo a outro contribuinte situado dentro ou fora do Estado de Goiás. Sendo constante estas operações, o produtor rural ou outro contribuinte, ao acumular crédito de ICMS em sua escrita fiscal poderá transferir seu saldo credor, de acordo com o que dispõe a IN GSF 715/2005.

 

A IN GSF 715/2005 prevê as hipóteses de acúmulo de crédito decorrente de exportação (artigos 2º, 3º, inciso I), de substituição tributária pelas operações posteriores (artigo 3º, inciso I-A, I-B, II, III) e de benefícios fiscais (artigo 3º, inciso VI e XIV).

 

Na hipótese do acúmulo de crédito previsto no item 2 da alínea “b” do inciso VI do artigo 3º e no inciso XIV, da IN GSF 715/2005, a transferência de crédito somente se aplica às máquinas, aos equipamentos, aos veículos ou aos materiais de construção adquiridos após o período de 12 meses consecutivos de acúmulo de crédito, e somente a partir de 1º de julho de 2022, em se tratando do inciso XIV do artigo 3º.

 

4.1. Hipótese excepcional de transferência de saldo credor acumulado

 

Esta hipótese é a mais curiosa, porque ela exige que o destinatário do crédito objeto da transferência se destine a outro contribuinte estabelecido no Estado de Goiás do qual tenha adquirido máquinas, equipamentos, veículos ou materiais de construção, e que os bens adquiridos sejam destinados à integração ao ativo imobilizado e a obras civis de estabelecimento localizado em Goiás e pertencente à empresa remetente do crédito.

 

Observe que a hipótese trata de crédito relacionado com operação ou prestação abrigada por benefício fiscal ou por tratamento tributário diferenciado previsto em lei específica, associados com o de manutenção de crédito pela entrada (Decreto nº 10.089/2022).

 

Ressaltado a condição de manutenção do crédito na escrita fiscal a que se refere o item 2 da alínea “b” do inciso VI do artigo 3º e no inciso XIV, da IN GSF 715/2005, para que os demais créditos sejam transferidos é exigido pela legislação que o contribuinte tenha um saldo credor acumulado mínimo de 3 meses consecutivos. Além disso, há um percentual de crédito a ser transferido, que não pode ultrapassar a média aritmética entre os saldos credores apurados nos últimos 3 meses imediatamente anteriores ao de referência e o saldo credor verificado no mês imediatamente anterior ao de referência.

 

Por fim, a transferência de crédito a outro contribuinte ainda fica limitada à 30% do valor da aquisição da mercadoria, bem ou serviços nas situações previstas no artigo 3º, inciso I e VI, quando o destinatário do crédito for o substituto tributário.

 

No que pertine à situação acumuladora de crédito pelo produtor rural, considerando as dificuldades deste cenário acontecer, seus créditos só poderiam ser transferidos observando uma limitação muito rígida, não podendo ser superior à 30% do saldo credor correspondente à média aritmética dos últimos 3 meses.

 

O percentual de 70% (artigo 5º, inciso IV, alíneas “b” da IN GSF 715/2005) de transferência de saldo credor para aquisição de máquinas, equipamentos, veículos ou materiais de construção, vaticinado por profissionais do seguimento tributário, não se aplicam aos produtores rurais, pois a norma em questão (inciso XIV do artigo 3º da IN GSF 715/2005), trata de crédito acumulado em razão de benefício fiscal ou por tratamento tributário diferenciado previsto em lei específica (vide artigo 2º do Decreto 10.089/2022), não aplicável ao produtor rural.

 

4.1.1. Transferência de saldo credor de ICMS acumulado em razão de exportações

 

Nesta hipótese (artigo 3º, inciso I), o limite de crédito a ser transferido está previsto no artigo 5º, inciso I, alínea “a”, item ‘1’ da IN GSF 715/2005, qual seja, 30% e deve ser destinado ao contribuinte que com ele mantenha relação comercial, visando aquisição de mercadorias.

 

Art. 5º A transferência de crédito a outro contribuinte fica limitada:
I – a 30% (trinta por cento) do valor da aquisição da mercadoria, bem ou serviço nas situações previstas:
a) no art. 3º:
incisos I e VII;

 

Não bastasse o limite dos créditos passíveis de serem transferidos estarem sujeitos ao limite de 30% das operações realizadas com fornecedores, o crédito precisa observar, ainda, outro limite máximo, entre o menor valor entre o que corresponder:

 

(a) à média aritmética dos saldos credores apurados nos últimos 3 (três) meses imediatamente anteriores ao de referência;

(b) ao saldo credor verificado no mês imediatamente anterior ao de referência.

 

A limitação imposta pela legislação tributária do Estado de Goiás, quanto aos créditos acumulados sobre as exportações é ilegal (AgInt no AREsp nº 2.184.718/RS, DJe de 14/9/2023) e afronta o que preconiza o artigo 25, § 1º, inciso II da LC 87/1996.

 

Art. 25. Para efeito de aplicação do disposto no art. 24, os débitos e créditos devem ser apurados em cada estabelecimento, compensando-se os saldos credores e devedores entre os estabelecimentos do mesmo sujeito passivo localizados no Estado.
§ 1º Saldos credores acumulados a partir da data de publicação desta Lei Complementar por estabelecimentos que realizem operações e prestações de que tratam o inciso II do art. 3º e seu parágrafo único podem ser, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento:
II – havendo saldo remanescente, transferidos pelo sujeito passivo a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito.

 

Logo, para transferir os saldos credores de ICMS acumulados em decorrência de exportações, a única condição exigida pela LC 87/1996, é que a autoridade competente reconheça o crédito acumulado.

No entanto, dispõe os artigos 8º e 9º da IN GSF 715/2005, autorização do Secretário da Economia do Estado de Goiás.

 

5. Conclusão

 

A legislação tributária, especialmente sobre os incentivos fiscais, possui inúmeras particularidades, requerendo do contribuinte muita cautela. A legislação exige dos produtores agrícolas, sobretudo, vários termos de credenciamento para se adequarem aos demais contribuintes inscritos como pessoas jurídicas. A grande maioria dos produtores são cadastrados na pessoa física, atuando de modo muito informal, motivo pelo qual não é típica a situação em que o produtor rural acumule crédito em sua escrita fiscal – caso opte para tanto.

 

Com a instituição da CBS, a produzir efeitos, efetivamente, a partir de 2027, e do IBS, a partir de 2029, será necessário que este seguimento empresarial, busque se adaptar às novas alterações de comportamento, inclusive quanto ao ICMS, uma vez que este tributo será extinto somente em 2033.

 

Quanto aos empreendimentos detentores de saldos credores de ICMS em sua escrita fiscal em razão de exportações, especialmente em relação àquelas estabelecidos no Estado de Goiás, há de se preocuparem com os efeitos da reforma tributária, porque se não derem vazão à estes saldos credores, após 2033, receberão em 240 meses, corrigidos pelo IPCA (artigo 134, § 3º, inciso II e § 5º do ADCT/1988).

 


[1] Quando não destinados à industrialização.

[2] Isenção condicionadas à saída para industrialização, bem como que o destinatário recolha o FUNDEINFRA.

[3] Hostifrutícolas, quando destinados à industrialização.

Compartilhe

Newsletter

Cadastre-se e receba dicas e notícias da Caldeira & Godinho



    Ao continuar navegando, você concorda com a utilização de cookies essenciais e tecnologias semelhantes de acordo com as Políticas de Privacidade.